Das projeções para a queda de juros e maior controle da inflação no mercado interno aos reais impactos na economia global com o conflito entre israelenses e palestinos, o cenário de incertezas tem elevado a cautela entre os investidores e reforçado a diversificação de iniciativas visando minimizar os riscos.
Para lidar com esse momento, a implementação de hedge tem sido uma alternativa mais presente entre os especialistas em investimentos já que é uma estratégia que dá uma maior margem de segurança em meio à imprevisibilidade do mercado. “Com toda essa turbulência e oscilação do mercado é preciso ter proteção e o hedge é uma opção para as situações que não estamos esperando, compondo assim uma estratégia diversa” avaliou Gustavo Salomão, sócio-fundador e CIO da Norte Asset Management.
Essa linha de atuação também é corroborada por Bruno Garcia, sócio-fundador e CIO da Truxt Investimentos. Para ele, no cenário recente de grande impacto com a alta taxa de juros no Brasil nos últimos dois anos, a Bolsa no país foi “carregada nas costas” pelo mercado de commodities e a diversificação tem sido a estratégia da gestora de fundos. “A gente conseguiu fazer em um primeiro momento hedges e giro em ações em tecnologia no exterior, principalmente no fim de 2021”, comentou Garcia, apontando que agora a tendência é de melhorar a performance devido ao ciclo de desinflação iniciado na economia do país.
PREVISIBILIDADE
Apesar de recente, essa melhora do cenário no país é o principal ponto positivo apontado pelos gestores em meio aos diversos fatores que têm dificultado uma maior previsibilidade nos investimentos. Após sair de uma taxa básica de juros de 2%, em 2021, e atingir 13,75% este ano, a Selic iniciou um ciclo de queda e, segundo o mercado, tem previsão de encerrar 2023 em 11,75%. Para o fim de 2024, a estimativa é que caia para 9% ao ano, e chegar a 8,5% nos próximos dois anos.
Dessa forma, a previsão do mercado financeiro para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) caiu de 4,86% para 4,75% neste ano, segundo estimativa divulgada pelo Banco Central (BC). A projeção é que a inflação chegue a 3,88%, em 2024, com índice na casa de 3,5% em 2025 e 2026.
Com esse cenário, a avaliação é de mudanças na atuação dos fundos de investimentos. Nos últimos dois anos, o mercado acompanhou uma migração do resgate de fundos de renda variável e mais arriscados para renda fixa, cujos aportes atingiram cerca de R$ 170 bilhões ao final de 2022 – o maior dos últimos 14 anos. “O que estamos vivendo é o efeito contrário, de desinflação, e esse movimento demora para o mercado se ajustar. O investidor ainda está cauteloso, mas a margem para investimentos deve se voltar para equities”, afirmou Salomão. As avaliações sobre o mercado de investimentos ocorreram durante o Investments Managers Forum, evento realizado pelo UBS , no último dia 18, em São Paulo (SP).
MERCADO EXTERNO COMO ALTERNATIVA
Enquanto a projeção para o Brasil é de melhora para os próximos anos com redução da taxa básica e maior controle da inflação], o cenário é de maior apreensão em um dos mercados mais estáveis do mundo: o americano. Isso porque a trajetória dos juros nos Estados Unidos mudou completamente desde o início da pandemia. Para atenuar a crise econômica, o Banco Central americano optou, em 2020, em baixar a taxa de juros a praticamente zero para facilitar o crédito. Entretanto, após dois anos com níveis estáveis, o Fed passou a elevar os juros seguidamente desde o ano passado atingindo, agora, 5,5%, o maior índice dos últimos 22 anos.
“Hoje, a bolsa americana oferece o retorno mais baixo da história. Vender ações para comprar treasuries desafia a lógica, mas é explicado pelo ‘behavioral finance’. Eu, particularmente, acho que estamos no fim do ciclo das treasuries pois os níveis de hoje nos Estados Unidos estão provocando um aperto que não víamos há muito tempo”, comentou Luis Stuhlberger, CEO e CIO da Verde Asset Management, um dos maiores gestores de fundos do país sendo o criador do Fundo Verde, um dos maiores e mais antigos hedge funds do Brasil lançado em 1997.
Entretanto, mesmo com os piores índices das últimas décadas, o mercado americano ainda é visto como boa alternativa para muitos gestores de investimentos. É o caso de Bruno Coutinho, CEO e CIO da Mar Asset Management. “A beleza desse mercado é poder ter a taxa de juros mais alta nos Estados Unidos e mesmo assim você ganhar”, disse ele, citando como exemplo as últimas projeções trimestrais que são divulgadas pelo FED que apontaram 15 cenários favoráveis para investimentos em um total de 19 combinações.
A avaliação é compartilhada por Fabiano Rios, sócio-fundador e CIO da Absolute Investimentos, que comparou a situação atual dos Estados Unidos com a China, cuja taxa de juros está mais baixa. “De todos os ativos de risco hoje, o que eu tenho mais confiança é na bolsa americana pois existe uma disparidade muito grande. Por que eu vou tomar o risco de investir no Brasil ou China se ainda há um mercado muito forte nos Estados Unidos?”, questionou Rios.
A avaliação para os próximos anos no mercado americano é de pessimismo. Além dos altos gastos dos últimos anos devido à pandemia e que elevaram as taxas de juros de hoje, o país ainda tem investido pesado em conflitos pelo mundo (Ucrânia, Taiwan e Israel) que vão pressionar ainda mais o déficit fiscal. “Apesar do budget muito grande, o que os Estados Unidos gastam não é sustentável a longo prazo. A bolsa americana, se continuar subindo como é previsto hoje, as empresas não vão aguentar com a carga fiscal”, apontou Stuhlberger.
“É preciso ser cauteloso pois a tendência nesse momento é ter pouco risco. A receita para esse momento é cautela, pouco risco e aguardar”, afirmou Coutinho.
CASES DE SUCESSO
Apesar do momento de instabilidade no mercado brasileiro nos últimos anos, alguns cases foram comentados para demonstrar que boas oportunidades de investimentos ocorrem mesmo em situações adversas, independente do setor. Entre eles está a PetroRio (PRIO), que se destacou ao investir na revitalização de áreas para extração de petróleo. O modelo de negócio apostou em áreas de pouca concorrência e com atuação extremamente eficiente, abrangendo campos próximos para possibilitar o compartilhamento de infraestrutura.
“Vimos que havia uma grande oportunidade nesse mercado que foi somado a uma questão de governança muito grande que tornou a PetroRio uma empresa ‘investível’ no setor de commodities”, explicou Marcelo Magalhães, sócio fundador e portfolio manager da Tork Capital.
Outro exemplo citado de empresas que se tornaram bons investimentos no mercado brasileiro é o Nubank, principal destaque entre as fintechs. O case foi comentado por Marcello Silva, sócio-fundador e CIO da Aster Capital, cuja atuação para identificar oportunidades no mercado está brada no uso de tecnologia e ciência de dados. Segundo ele, a capacidade de fazer diligência a partir do uso de dados foi fundamental para identificar a oportunidade.
“O Nubank teve movimentos importantes como ter adquirido plataformas de tecnologia, o que resolveu o problema de desenvolvimento. Ao estudar com mais profundidade o que as empresas de tecnologia têm feito, o Nubank se tornou referência por ter essa visão diferente”, afirmou o especialista da Aster Capital. “Esse é um exemplo de que é preciso casar esse olhar da nossa empresa brada em ciência de dados tendo uma visão no médio e longo prazo”, completou Silva.
Fonte: Valor Econômico