O dólar fechou nesta última segunda-feira, 2, em alta superior a 1% ante o real, no quinto avanço consecutivo, estabelecendo uma nova cotação recorde, com o mercado reagindo às ameaças do presidente eleito dos EUA, Donald Trump, contra os Brics e ainda sensível ao pacote de medidas fiscais anunciado na semana passada no Brasil.
O dólar à vista fechou o dia com alta de 1,07%, cotado a 6,0652 reais — maior valor nominal de fechamento da história. No ano a divisa dos EUA acumula elevação de 25%.
Às 17h05, o dólar para janeiro — o mais líquido no Brasil — subia 1,32%, aos 6,0805 reais.
O Ibovespa fechou em queda nesta segunda-feira, sem catalisadores positivos para as ações brasileiras no curto prazo no radar de investidores, que permanecem pessimistas sobre a situação fiscal no país e enxergam um ambiente menos favorável a mercados emergentes após a eleição norte-americana.
Índice de referência do mercado acionário brasileiro, o Ibovespa cedeu 0,34%, a 125.235,54 pontos, com Vale e Ambev oferecendo algum contrapeso. Durante a sessão, marcou 124.733,89 pontos na mínima e 125.901,06 pontos na máxima.
O volume financeiro no pregão somou 24,6 bilhões de reais.
O dólar no dia
No último sábado, Trump exigiu que os países membros do Brics — entre eles, o Brasil — se comprometam a não lançar uma nova moeda ou apoiar outra divisa que substitua o dólar, sob pena de enfrentarem tarifas de 100% sobre seus produtos.
“Exigimos que esses países se comprometam a não criar uma nova moeda do Brics nem apoiar qualquer outra moeda que substitua o poderoso dólar americano, caso contrário, eles sofrerão 100% de tarifas e deverão dizer adeus às vendas para a maravilhosa economia norte-americana”, escreveu Trump em sua plataforma de mídia social, a Truth Social.
Em reação, o dólar subia ante todas as divisas dos Brics nesta segunda-feira, além de avançar em relação às demais moedas em um dia marcado pela queda do euro.
Internamente, o pacote fiscal lançado pelo governo na semana passada seguia como fonte de pressão de alta para o dólar. Se por um lado o corte de 71,9 bilhões de reais em despesas em dois anos foi bem recebido, por outro a isenção de Imposto de Renda para quem ganha acima de 5 mil reais por mês seguia sendo criticada.
“Beirou o fisco a forma como o pacote foi trazido. O governo trouxe o aviso esperado, com cortes, mas veio com a questão da isenção do IR”, pontuou Felipe Izac, sócio da Nexgen Capital. “Foi muito ruim. O mercado reagiu muito fortemente a isso e o câmbio desancorou.”
Desde o lançamento do pacote, apesar das tentativas do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de reduzir a pressão, defendendo as medidas anunciadas, o dólar segue em trajetória de alta.
Nesta última segunda-feira, após marcar a cotação mínima de 6,0052 reais (+0,07%) às 9h15, o dólar à vista atingiu a máxima de 6,0920 reais (+1,51%) às 13h05.
Em análise do cenário brasileiro, os estrategistas Thierry Wizman e Gareth Berry, da gestora global Macquarie, afirmaram que embora o Banco Central do Brasil siga “agressivo” nos juros diante das preocupações com a política fiscal frouxa, os aumentos da Selic “não serão suficientes para dissuadir novas minicrises”.
“Isso ocorrerá enquanto os operadores não puderem ter fé na estabilidade da relação dívida/PIB do Brasil”, afirmaram os estrategistas, acrescentando que eles esperam agora um dólar em 6,30 reais em meados de 2025.
Apesar do cenário de forte pressão para o dólar desde a semana passada, o Banco Central seguiu ausente do mercado.
Durante evento pela manhã em São Paulo, o diretor de Política Monetária do BC, Gabriel Galípolo, reiterou que a autarquia só atua no câmbio em caso de disfuncionalidades.
“Efetivamente, a gente vai continuar fazendo atuações só por questões de disfuncionalidades, como essa de você ter uma sazonalidade de final de ano de dividendos que vão para fora e coisas desse tipo”, afirmou.
Ele disse ainda não esperar mudanças na política cambial do BC com a chegada de Nilton David, indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para assumir a diretoria de Política Monetária a partir de janeiro, quando Galípolo tomará posse como presidente da autarquia.
No exterior, às 17h25, o índice do dólar — que mede o desempenho da moeda norte-americana frente a uma cesta de seis divisas — subia 0,22%, a 106,270.
O dia do Ibovespa
No ano, o Ibovespa acumula um declínio de 6,35%, que se mantido durante dezembro reverterá a tendência apurada nos dois anos anteriores — +22,28% em 2023 e +4,69% em 2022.
Estrategistas do BTG Pactual decidiram tornar o portfólio de ações recomendado para dezembro “muito mais defensivo”, adicionando ações com um fluxo de caixa de curta duração, pagadoras de altos dividendos e empresas que ganham com um dólar mais forte, conforme relatório enviado a clientes.
“A situação fiscal do Brasil vem se deteriorando rapidamente e, a esta altura, parece claro que, sem mudanças mais robustas no orçamento, a estrutura fiscal existente é insustentável e a trajetória da dívida é explosiva”, destacaram Carlos Sequeira e equipe no documento enviado nesta segunda-feira.
Eles também chamaram a atenção para as expectativas de inflação elevada no país, ressaltando que as taxas de curto prazo devem subir muito mais, enquanto, no exterior, a dominância republicana nas eleições confirmou um cenário que aponta para taxas de juros de logo prazo mais altas.
“Sem dúvida, o aumento das taxas de juros de longo prazo nos EUA é parcialmente responsável pelo aumento das taxas reais de longo prazo do Brasil e pela queda das ações”, acrescentaram.
Em relação ao cenário dos Estados Unidos, os analistas Victor Natal e Mathias Dabdab, do Itaú BBA, também acrescentaram que uma agenda mais protecionista, com tarifas de importação mais altas, pode resultar em uma desaceleração da economia global e colocar pressão inflacionária nos EUA.
“Menos crescimento global deve impactar negativamente países exportadores, como o Brasil, e uma inflação mais persistente pode levar a um cenário de menos cortes de juros por lá – o que, por sua vez, pode pressionar as taxas de juros por aqui também”, ressaltaram em relatório enviado a clientes.
Na visão de Natal e Dabdab, o desfecho das eleições nos EUA, que trouxe um cenário menos favorável para países emergentes, e o pacote fiscal, que foi mal recebido pela maior parte dos investidores, afastaram a esperança de um rali de fim de ano.
Dezembro também começou com a primeira prévia da carteira do Ibovespa que irá vigorar a partir do dia 6 de janeiro, que registrou a entrada das ações da Marcopolo e a saída dos papéis da Alpargatas e da Eztec. Outras duas prévias serão divulgadas antes da versão final.